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O bom de ter em mãos um livro de uma poeta que não teve pressa, que se debruçou com devoção ao seu fazer poético antes de lançá-lo ao mundo, é se deparar com um trabalho que vem com a força daquilo que urge, é ter em mãos um livro maduro e impactante.


Tutano é um livro de estreia de uma poeta veterana, resultado de anos de um mergulho profundo em um universo poético que vai de Rimbaud a William Carlos Williams, de Sylvia Plath a Ana Cristina Cesar, e de onde, como uma exumadora, Ana Marta Cattani recolhe material para a construção de um universo próprio, muitas vezes devorando e recriando o objeto de adoração: “eu te faria mil oferendas/ e depois comeria a tua caveira/ como se fosse de chocolate”.


É também um livro de estreia de uma mulher versada na vida e nos costumes do que lhe foi ensinado e imposto, e que diante da passagem do tempo se desdobra e proclama: “agora posso gritar/ do alto dos meus chinelos:/ soy mayor”. Uma mulher que, ao alcançar o meio do caminho, para e reflete sobre a paisagem que ficou para trás e a que tem pela frente, que com lucidez e coragem olha para os dois extremos da vida:
a primeira respiração e a última memória.


É desse lugar, de quem construiu minuciosamente seu universo poético, que Ana Marta, com uma escrita ácida e perspicaz, devolve à mulher o que lhe foi negado. À primeira vista pode parecer o contrário, corre-se o risco de confundir desejo com submissão: “queria arruinar-me a teus pés”. Porém, ao avançarmos no texto, encontramos a urgência de devolver ao homem o que é do homem, “em algum momento será preciso expulsar todos os sapos, grandes, médios e pequenos”, acompanhamos o desejo de devorar a carne,
“um homem esquartejado/ que possa ser deglutido em avos”, até alcançarmos a subversão total de papéis: aqui é o homem que ocupa o lugar de objeto à disposição dos desejos da mulher, “um homem em decúbito dorsal ao meu lado/ um homem para enfiar minha mão/ entre suas costelas”. Então, a mulher passa a ocupar um lugar que não se equipara ao do homem: não se trata de uma inversão de papéis, mas de um lugar onde pode, enfim, exercer seus dons e poderes, e que só é possível ser alcançado devorando o homem — até os ossos.

 

Tatiana Eskenazi

 

Ana Marta Cattani (São Paulo, SP) é escritora, advogada e mestre em Direito Civil. Pós-graduada pela Formação de Escritores do Instituto Vera Cruz, tem poemas publicados na plaquete coletiva Orquídeas: como cultivar – poemas pela democracia e na coletânea Prêmio Off Flip de Literatura (Selo Off Flip, 2020). Selecionada para a residência literária Kaaysá Art Residency/Tomar Corpo (2019), integra a antologia resultante desta residência: Corpo de Terra (Quelônio, 2021). Em 2020, fundou A Capivara, instituto dedicado às artes da palavra. Tutano é seu livro de estreia.

 

FICHA TÉCNICA

Gênero Poesia

Páginas 74

Formato 130 x 200 mm

ISBN 978-65-86042-79-5

Tutano

R$40.00Preço

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